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Tatiana Mendizabal é coordenadora de comunicação corporativa e campanhas do Instituto Akatu, uma organização não governamental sem fins lucrativos que trabalha pela conscientização e mobilização da sociedade para o consumo consciente.

Há 10 anos no mercado de agências de comunicação, Tatiana teve experiências adquiridas na AlmapBBDO, na Tribo Interactive e por 3 anos no mercado espanhol gerenciando contas internacionais. Esteve à frente da abertura da T2O Mídia Digital no Brasil, liderando a operação e gestão de clientes como F1, Abril e TAM.

01. O Instituto Akatu é uma instituição sem fins lucrativos que trabalha pela conscientização e mobilização da sociedade para o Consumo Consciente. O que é exatamente “Consumo Consciente”?

O consumo é consciente quando o consumidor busca aumentar os impactos positivos e reduzir os impactos negativos em suas compras, uso e descarte de produtos ou serviços.

O consumidor consciente procura ter conhecimento dos impactos individuais, sociais, econômicos e ambientais do consumo e assume um papel protagonista e transformador em suas decisões de consumir. Sua atuação começa antes mesmo de consumir, ao refletir em cada uma das etapas do consumo: porque comprar?; o que comprar?; como comprar?; de quem comprar?; como usar?; e como descartar?

Comprar depois dessa reflexão ajuda o consumidor consciente a buscar conhecer os impactos de suas decisões de consumo e a perceber o poder transformador dos seus atos de consumo, além de tornar o consumo menos automático e menos impulsivo.

02. O ano de 2015 deverá ser o ano da produtividade, segundo alguns analistas, para podermos competir em custo e qualidade. Como o Consumo Consciente pode contribuir neste processo?

Uma maneira de tornar consciente o processo do consumo é buscar responder a seis perguntas.

(i)   Por que comprar? – Antes de comprar, perguntar-se se o produto é mesmo necessário, ou se a compra está sendo provocada pela propaganda ou pelo impulso, que podem estimular a comprar mais do que se necessita ou do que  se pode comprar. Mães e pais tendem a ser muito influenciados pelos filhos na hora da compra, o que torna importante responder a essa pergunta. Nesse sentido,  vale lembrar o que realmente é importante na vida de cada um de forma a priorizar o consumo de produtos e serviços nessa direção. Isto muitas vezes pode significar o consumo de algo não material – que demanda poucos recursos naturais em sua produção – no lugar do material, como por exemplo ler uma história juntos e que divertirá toda a família, ou sair com os amigos para um bate papo.

(ii) O que comprar? – Neste momento, busca-se caracterizar o produto que se quer comprar, analisar as diversas opções disponíveis para compra, conhecer as funcionalidades que oferecem, e então escolher as características que atendem às reais necessidades.  Neste momento, busca-se ainda definir o nível de qualidade e durabilidade do produto a ser comprado, suas características de segurança no uso e outros elementos que permitam fazer a escolha do produto a ser comprado.

(iii) Como comprar? – Devo comprar à vista ou a prazo? Preciso do produto agora? Ou posso adiar a sua compra, economizar para comprar o produto à vista, economizando os juros do financiamento?  Devo comprar perto ou longe de casa? Vou de carro, ônibus, bicicleta, a pé? Como vou trazer minhas compras? Em sacolas plásticas descartáveis, sacolas duráveis, ou caixas de papelão? Às vezes fazer as compras no final de semana, indo com a família de bicicleta,  pode virar algo divertido !

(iv) De quem comprar? – Ao escolher a empresa fabricante do produto a ser comprado, a decisão deve considerar as características da produção, como o cuidado no uso dos recursos naturais, a preservação do meio ambiente, o tratamento e a valorização dos funcionários, o cuidado com a comunidade, a contribuição para a economia local. Assim, ao decidir comprar de uma dada empresa, o consumidor pode “votar” nas empresas que melhor cuidam da sociedade e do planeta e cujos produtos, ao mesmo tempo, atendem às características definidas na etapa “o que comprar?”.

(v) Como usar? – É essencial ser cuidadoso com o que foi comprado, usando os produtos até o final da sua vida útil, consertando-os se quebrarem (antes de pensar em comprar um novo), reformando o produto para torna-lo mais atualizado, etc. Todas essas são formas de uso consciente do produto comprado e que evitam a troca rápida de itens sempre que algo novo surge no mercado ou entra na moda. São também parte do uso consciente: desligar aparelhos eletrônicos quando não estão em uso, usar apenas a água necessária nas diversas atividades domésticas etc.

(vi) Como descartar? – Este é o momento de se perguntar se o que se quer descartar realmente não tem mais nenhuma utilidade, seja para a própria pessoa, seja para outras. O que resta de um produto ou de sua embalagem são resíduos que, em alguns casos, podem se transformar em brinquedos ou ter um outro tipo de utilidade na casa; roupas antigas que podem virar roupas mais modernas, usando o pano e os acessórios por mais tempo, etc. E, quando o produto ou a embalagem realmente não tiverem mais utilidade, deve-se buscar descartar os resíduos de maneira correta, enviando o que for possível para reciclagem, compostando alimentos orgânicos para produção de adubo, e jogando no lixo somente o que realmente não tem nenhuma serventia (essa é a diferença entre resíduos e lixo: lixo é o que não tem mais nenhuma serventia, não podendo nem mesmo ser enviado para reciclagem).

03. Imaginamos que para podermos exercer o consumo consciente precisamos de muitas informações a respeito da cadeia produtiva de cada item a ser consumido. Como o consumidor pode obter estas informações, elas estão disponíveis para consultas? 

As informações tão essenciais aos consumidores são realmente muito difíceis de serem encontradas. As empresas buscam cada vez mais a transparência de informações de seus processos e cadeia produtiva , porém este ainda é o grande desafio: tornar essas informações públicas e de fácil acesso ao consumidor final.

O primeiro fator para acelerar esse processo de consumo consciente é dar a perceber ao consumidor o grande poder contido nos atos de consumo, de modo a levá-lo a buscar usá-lo como ato de cidadania, como ato de construção do mundo em que se vai viver.

Além disso, é fundamental prover informações confiáveis, de qualidade e claras, que tornem a escolha dos consumidores mais fácil e mais consciente. Os consumidores precisam comparar produtos e serviços, em todas as etapas dos seus processos de produção, para que possam escolher os que têm o menor impacto negativo e o maior positivo para a sociedade e para o planeta, e, consequentemente, para eles mesmos.

É também fundamental levar o consumidor a pensar em seu bem estar, considerando o consumo como uma forma de suprir bem estar à sua vida. Dessa forma, o consumo deixa de ser um fim em si mesmo e passa a ser um instrumento de bem estar.

Buscando o bem estar, e consciente dos impactos do consumo, o consumidor buscará comprar o que realmente necessita, sem excessos, buscando reduzir o uso de recursos naturais e aumentar os benefícios sociais de seu consumo. Com isso, o consumidor consciente tende a agir de forma menos automática e a pensar antes de realizar uma compra.

04.  Como o brasileiro vem se desenvolvendo no sentido de estar mais consciente em relação ao consumo, e como isso se compara com outros países mais avançados?

Em uma pesquisa realizada pelo Instituto Akatu em 2013, os brasileiros associaram felicidade à saúde para si e para a família (63%), à possibilidade de conviver com familiares e amigos (60%) e a ter qualidade de vida (36%). Todos esses aspectos superaram a preferência pela posse de bens materiais ou por ter dinheiro (30%).

A mesma pesquisa mostrou uma preferência marcante do consumidor por soluções sustentáveis em temas como alimentação, mobilidade e afetividade, em substituição aos caminhos ou soluções que envolviam o mero consumo ou mera posse de bens.

E a pesquisa revela uma forte relação entre a consciência no consumo e a busca pela sustentabilidade, dado que, quanto mais consciente for o consumidor, mais fortemente irão se manifestar suas preferências por caminhos mais sustentáveis comparativamente aos caminhos mais voltado ao consumo.

Desde 2003, quando se começou a medir a assimilação de comportamentos de consumo consciente do consumidor brasileiro, verifica-se uma estabilidade na quantidade de consumidores classificados como conscientes (5%) mesmo em um período de pleno emprego e estímulos econômicos ao consumo, o que significou um aumento de cerca de 500 mil pessoas nesse grupo, dado o crescimento da população.

O Brasil caminha para um cenário mais consciente, porém ainda é um país em desenvolvimento baseado no consumismo e com pouco conhecimento sobre consumo consciente, embora a pesquisa demonstre que mesmo neste cenário de consumo é prioritário ao brasileiro a importância da saúde, convívio com família e amigos e qualidade de vida para conseguir se aproximar a uma sociedade do bem estar.

05. Você acredita que o consumo consciente está relacionado com o desenvolvimento econômico dos países?

Se mantivermos o mesmo modelo de produção e consumo que temos hoje e toda a humanidade pudesse consumir como a média dos consumidores dos países mais ricos, precisaríamos dos recursos naturais de 5 planetas para abastecer esse volume de consumo.

Com isso, temos hoje uma sociedade insustentável: socialmente injusta dada a má distribuição do consumo entre as regiões e as pessoas; ambientalmente insustentável, dado já se consumir mais recursos renováveis (ar, água, terra agricultável, absorção de resíduos) do que a Terra é capaz de renovar; e economicamente vulnerável, dado que para manter o crescimento das economias em uma situação de forte concentração do consumo, os governos e as empresas recorreram a incentivos ao consumo que tornam o consumidor vulnerável a um forte endividamento e a uma alienação em relação à própria vida.

E esse quadro só se aprofundará no futuro. Basta ver que cerca de 150 milhões de pessoas no mundo todo emergem para a classe média, o que significa entrarem no mercado de consumo de massa. Em 20 anos, serão 3 bilhões de consumidores a mais no planeta, totalizando 4 bilhões de consumidores, se considerado o 1 bilhão existentes hoje). Por um lado, é preciso qualificar a natureza das ações que vem sendo feitas pelas empresas dentro desse quadro. De um modo geral, as empresas se limitam a práticas de Responsabilidade Social Corporativa (CSR), em que cada empresa procura fazer melhor o que ela já faz, buscando reduzir os impactos negativos e aumentar os positivos no meio ambiente e na sociedade.

Raramente as empresas estão de fato voltando seus esforços a construir um cenário de efetiva sustentabilidade em um período de 20 anos, visto que isso exigiria enfrentar riscos pela alteração radical nos produtos e serviços de modo a  entregar bem estar aos consumidores de uma maneira radicalmente distinta da de hoje. As empresas vêm buscando tais ações na margem de seus negócios, o que é compreensível dada a pressão dos investidores por retorno financeiro de curto prazo.

Aqui fica clara a necessidade de conscientizar os investidores para os riscos negociais de manter operando um sistema que já ultrapassou os limites planetários e não atende de maneira minimamente equitativa as necessidades sociais.

Assim, para que a mudança na direção da sustentabilidade possa de fato ocorrer, é preciso um conjunto de ações que o Akatu chamou de “equação de sustentabilidade”, de forma a levar a mudanças radicais na forma de prover bem estar à população humana, respeitando os limites planetários e atendendo as necessidades sociais.

Os elementos da equação da sustentabilidade que levariam a  essa direção envolvem necessariamente diversos fatores:

A. Mudanças radicais em tecnologia

B. Mudanças radicais em políticas públicas

C. Nova consciência dos consumidores levando a novos estilos de vida

D. Produtos e serviços radicalmente novos para viabilizar os novos estilos de vida

E. Nova organização da sociedade para viabilizar os novos estilos de vida

F. Nova consciência dos investidores que os leve a olhar para os retornos a longo prazo dos seus investimentos.

 

Flavia Secaf

Flavia Secaf

Sócia, Consultora e Coach, Flavia Stuart Secaf especialista em psicologia clínica, psicologia da educação e gestão empresarial, atuou em instituições públicas e privadas como consultora, orientadora e avaliadora educacional. Psicóloga clínica pela PUC-SP e Coach Executiva e Life Coach pelo ICI - Integrated Coaching Institute.

Join the discussion One Comment

  • Francisco Alvarez disse:

    A abordagem é bastante positiva mas exige uma reflexão e mudança cultural da sociedade que neste momento de escassez de água e energia não poderia ser mais adequado. É preciso refletir sobre valores e responsabilidades individuais.

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